Para Sempre, com Você

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Para Sempre, com Você
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P A R A S E M P R E, COM V O C Ê

(A POUSADA EM SUNSET HARBOR - LIVRO 3)

S O P H I E L O V E

Sophie Love

Fã de longa data de romances, Sophie Love está muito feliz em publicar sua primeira série de livros,que começou com AGORA E PARA SEMPRE (A POUSADA EM SUNSET HARBOR – LIVRO 1).

Sophie adoraria ouvir seus comentários, então, visite www.sophieloveauthor.com se quiser enviar-lhe um e-mail, receber eBooks de graça, saber das novidades e manter contato!

Copyright © 2016 por Sophie Love. Todos os direitos reservados. Exceto como permitido pelo Ato de Direitos Autorais dos EUA, publicado em 1976, nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida, distribuída ou transmitida em qualquer formato ou por qualquer meio, ou armazenada num banco de dados ou sistema de recuperação, sem permissão prévia da autora. Este eBook está licenciado apenas para uso pessoal. Este eBook não pode ser revendido ou doado a outras pesoas. Se você quiser compartilhar este eBook com outra pessoa, por favor, compre uma cópia adicional para cada indivíduo. Se você está lendo este livro sem tê-lo comprado, ou se não foi adquirido apenas para seu uso, por favor, devolva-o e compre seu próprio exemplar. Obrigado por respeitar o trabalho da autora. Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, empresas, organizações, lugares, eventos e incidentes são produto da imaginação da autora ou usados de forma fictícia. Qualquer semelhança com pessoas reais, vivas ou mortas, é mera coincidência. Foto da capa: EpicStockMedia, todos os direitos reservados. Usada sob licença da Shutterstock.com.

LIVROS DE SOPHIE LOVE

A POUSADA EM SUNSET HARBOR

AGORA E PARA SEMPRE (Livro 1)

PARA TODO O SEMPRE (Livro 2)

PARA SEMPRE, COM VOCÊ (Livro 3)

SUMÁRIO

CAPÍTULO UM

CAPÍTULO DOIS

CAPÍTULO TRÊS

CAPÍTULO QUATRO

CAPÍTULO CINCO

CAPÍTULO SEIS

CAPÍTULO SETE

CAPÍTULO OITO

CAPÍTULO NOVE

CAPÍTULO DEZ

CAPÍTULO ONZE

CAPÍTULO DOZE

CAPÍTULO TREZE

CAPÍTULO CATORZE

CAPÍTULO QUINZE

CAPÍTULO DEZESSEIS

CAPÍTULO DEZESSETE

CAPÍTULO DEZOITO

CAPÍTULO DEZENOVE

CAPÍTULO VINTE

CAPÍTULO VINTE E UM

CAPÍTULO VINTE E DOIS

CAPÍTULO VINTE E TRÊS

CAPÍTULO VINTE E QUATRO

CAPÍTULO VINTE E CINCO

CAPÍTULO VINTE E SEIS

CAPÍTULO VINTE E SETE

CAPÍTULO UM

Emily olhou para a linda menina dormindo tranquilamente na cama de Daniel. Seu cabelo loiro estava espalhado pelo travesseiro branco. Seus traços eram inconfundivelmente de Daniel. Ela parecia um anjo.

Estava escuro lá fora, e a única luz a iluminar o cômodo vinha do luar que passava pelas cortinas, deixando tudo num tom de azul suave. Emily havia perdido a noção do tempo, mas, a julgar pelo cansaço que sentia até os ossos, estava perto do amanhecer.

Ouviu a porta abrir rangendo e olhou sobre o ombro. Daniel estava de pé, a silhueta iluminada pela luz lareira. Apenas vê-lo fez o coração dela acelerar. Era como uma miragem, como ver um soldado que voltava para casa depois da guerra.

“Ela ainda está dormindo?” ele sussurrou.

Emily assentiu. Apesar dele ter voltdo e estar de pé na sua frente depois de uma ausência de seis semanas, Emily ainda não podia acreditar direito, não podia baixar a guarda completamente. Era como se antecipasse o momento em que ele anunciaria que estava indo embora mais uma vez, que tiraria Chantelle da vida dela tão suavemente quanto a trouxe.

Eles deixaram o quarto juntos, fechando a porta silenciosamente para não acordar a menina.

“Deve ter sido uma longa viagem do Tennessee até aqui”, Emily disse, ouvindo como sua própria voz estava contida, como se não se sentisse à vontade na companhia de Daniel. “Deve estar exausto”.

“Acho que estamos todos”, Daniel replicou, reconhecendo em uma frase o martírio pelo qual ele a fez passar.

Enquanto se sentavam juntos à mesa, Daniel fitou Emily com olhos sérios.

“Emily”, ele começou, com a voz embargada, “não sei como dizer isso, como escolher as palavras. Sabe como essas coisas são difíceis para mim”.

Ele sorriu, sem graça. Emily sorriu também, mas sentiu o coração batendo forte de angústia. Seria isso? Ele estava prestes a anunciar a partida dele e de Chantelle? Voltou apenas para dizer-lhe pessoalmente que estava tudo acabado? Sentiu os olhos se encherem de lágrimas. Daniel pegou na sua mão. O gesto bastou para fazer as lágrimas que ela tentava segurar caírem de seus olhos, descendo pelo rosto, até chegar no tampo da mesa.

“Sinto muito”, Daniel disse. “Não é o bastante, eu sei, mas é tudo o que tenho, Emily. Sinto tanto por tudo que te fiz passar. Ter ido embora daquele jeito”.

Emily apenas mexeu os lábios, supresa por não conseguir falar as palavras que já tinha preparado.

“Mas fez a coisa certa”, ela disse. “Foi até sua filha. Aceitou a responsabilidade. Fez o que eu esperaria de você”.

Agora, era Daniel quem parecia confuso, como se as palavras que ele esperava dela não tivessem sido ditas. “Mas eu te deixei sozinha”, confessou.

“Eu sei”, Emily replicou, sentindo uma pontada de dor no coração que machucou tanto quanto no dia em que ele partiu. “E doeu, não vou mentir. Mas o que você fez, isso faz com que eu saiba que você é um homem bom”. Por fim, ela conseguiu ver através das lágrimas. “Você assumiu seu papel. Tornou-se pai. Acha mesmo que eu usaria isso contra você?”

“Eu… não sei”, Daniel disse, com um nó na garganta.

Emily nunca havia visto aquela expressão no rosto dele. Era um olhar de completo alívio. Percebeu então que ele achava que estaria com raiva dele, que ficaria furiosa quando o visse.

Mas Emily nunca ficou com raiva, ela só estava aterrorizada com a possibilidade dos dois não poderem forjar uma vida juntos agora que Daniel tinha uma filha para cuidar.

Agora, era a vez de Emily confortá-lo, deixar claro que ele não precisava sentir culpa pelo que fez. Ela apertou sua mão.

“Estou feliz”, ela disse sorrindo, apesar das lágrimas. “Mais do que feliz, estou super feliz. Nunca pensei que isso fosse uma possibilidade. Que você a trouxesse consigo para casa. Daniel, eu não podia estar mais feliz do que estou neste momento”.

Daniel abriu um sorriso. Ele se levantou rapidamente da mesa e tomou Emily nos braços, puxando-a da cadeira. Beijou seu rosto, pescoço, como se quisesse apagar com beijos a dor que ele havia causado, fazendo-a chorar. Emily sentiu todo o seu corpo relaxar, toda a tensão derreter e sumir. Seu corpo permaneceu adormecido pelas últimas seis semanas, e agora ali estava Daniel acordando todas aquelas partes dela que estavam em pousio. Ela o beijou com uma paixão crescente. Ele era o Daniel dela, com o mesmo perfume amadeirado de floresta e ar fresco, com suas mãos ásperas passando pelo corpo dela, com seus dedos se enroscando em seu cabelo emaranhado. Ela sentiu o sabor de Daniel, de hortelã e chá, um sabor que funcionava como o sino de Pavlov para deixá-la excitada.

Quando ele se afastou um pouco, Emily sentiu a esmagadora ausência.

“Não podemos”, ele disse, baixo. “Não aqui. Não com Chantelle dormindo”.

Emily assentiu, apesar de seus lábios estarem latejando de desejo. Daniel estava certo. Precisavam ser sensíveis, serem adultos. Agora, tinha a responsabilidade de fazer o melhor pela menina. Ela sempre deveria estar em primeiro lugar.

“Pode me segurar?” Emily disse.

Daniel a fitou, e ela reconheceu o olhar de adoração em seus olhos. Havia sentido tanta falta daquele olhar, e ainda assim parecia que as seis semanas de separação o haviam tornado mais intenso. Ninguém nunca tinha olhado para Emily daquela maneira, fazendo seu coração acelerar.

 

Ela pegou a mão de Daniel e o levou até o sofá. Juntos, eles afundaram nele, o toque do veludo verde lembrou a Emily imediatamente de quando fizeram amor aqui, ao lado da lareira. Enquanto Daniel a envolvia nos braços, ela se sentiu tão feliz quanto naquela noite, ouvindo o bater do coração dele, sentindo seu cheiro. Não havia outro lugar em que ela quisesse estar naquele momento, só ali, com Daniel, seu Daniel.

“Senti saudade”, ouviu-o dizer. “Tanta”.

De algum modo, naquela posição, aconchegada nele, sem olhar nos olhos, Emily achou mais fácil falar sobre seus sentimentos. “Se sentiu tanto a minha falta, podia ter ligado”.

“Não podia”.

“Por que não?”

Ele suspirou.

“O que estava acontecendo era tão intenso que não podia lidar com o pensamento de você desistir de mim. Se tivesse te ligado, poderia ter confirmado meus piores medos, entende? A única maneira de suportar aquela provação foi me agarrar à esperança de que você ainda estaria esperando por mim quando eu voltasse”.

Emily engoliu em seco. Doía ouvi-lo falar aquilo, mas gostou da sinceridade dele. Sabia que tudo tinha sido incrivelmente difícil para ele e que ela precisava ser paciente. Mas, ao mesmo tempo, ela também passou por uma provação. Seis longas semanas sem uma palavra, esperando e imaginando o que poderia acontecer quando Daniel voltasse, ou se ele sequer voltaria. Nem lhe ocorreu que ele traria sua filha consigo. Agora, tinha que começar a pensar de que maneira suas vidas, e seu namoro, mudaria agora, que tinham uma criança para cuidar. Ambos estavam sobre um terreno instável.

“Parece que você não confiava muito em mim”, Emily disse baixinho.

Daniel não disse nada. Então, começou a acariciar o cabelo dela. “Eu sei. Deveria ter confiado mais em você”.

Emily suspirou profundamente. Por ora, aquilo era tudo que precisava ouvir; a afirmação de que foi a falta de confiança dele que havia tornado uma situação complicada em algo muito mais difícil do que o necessário.

“Como foi?” Emily perguntou, curiosa, mas também numa tentativa de fazer Daniel se abrir, ajudá-lo a não sofrer em silêncio. “Quer dizer, o tempo que passou no Tennessee”.

Daniel respirou fundo. “Fiquei num hotel de beira de estrada. Visitava Chantelle todo dia, apenas para tentar protegê-la, ser um rosto amigo, de confiança. Elas estavam morando com o tio de Sheila. Não havia literalmente nada lá para uma criança”. Sua voz revelou emoção. “Na maior parte do tempo, Chantelle tentava apenas não ficar no meio do caminho. Havia aprendido a não incomodar nenhum dos dois”.

O coração de Emily apertou. “Chantelle viu os dois usarem drogas?”

“Acho que não”, foi a resposta de Daniel. “A vida de Sheila está completamente bagunçada, mas ela não é um monstro. Sei que se importa com Chantelle. Mas não o bastante para entrar na reabilitação”.

“Você tentou fazê-la ir?”

Emily ouviu Daniel sugar o ar entre os dentes.

“Todo santo dia”, ele disse, cansado. “Disse que pagava. Disse que encontraria um lugar para que els não tivessem que morar mais com o tio”. Na voz de Daniel, Emily podia sentir a dor em seu coração, seu desespero pelo estado infeliz da vida de sua filha. Parecia insuportável. “Mas não se pode forçar alguém a mudar se a pessoa não está pronta. Um dia, Sheila aceitou que Chantelle ficaria melhor comigo”.

“Por que ela não te contou que estava grávida?” Emily perguntou.

Daniel riu com tristeza. “Ela pensou que eu seria um pai ruim”.

Emily não podia imaginar o tipo de homem que Daniel já deve ter sido para fazer alguém pensar tal coisa. Para ela, Daniel seria o pai perfeito. Sabia que ele tinha tido uma fase de bad boy, alguns anos rebeldes em sua juventude, mas tinha certeza de que essa não podia ser a verdadeira razão pela qual Sheila havia escondido a gravidez dele, ou mantindo a existência da menina em segredo. Era uma desculpa, uma mentira dita por uma drogada tentando desviar a atenção de seus erros.

“Não acredita nisso, não é?” Emily perguntou.

Ela sentiu a mão de Daniel acariciando seus cabelos novamente. “Não sei como eu me comportaria há seis anos, quando ela nasceu. Ou mesmo quando Sheila estava grávida. Não gostava muito de compromisso na época. Poderia ter fugido”.

Emily se virou para olhar para Daniel, e envolveu o pescoço dele em suas mãos. “Não, não teria”, ela implorou. “Você se tornaria um pai para aquela menininha, assim como está fazendo agora. Teria sido um homem bom, teria feito a coisa certa”.

Daniel a beijou suavemente. “Obrigada por dizer isso”, ele disse, apesar de sua voz trair sua incerteza.

Emily se aconchegou novamente nele, ainda mais apertado. Ela não queria vê-lo assim, sofrendo, duvidando de si. Parecia estar no limite, Emily pensou, e se perguntou se ele estava lutando com o reajustamento de estar em casa, de ter se tornado pai de repente. Daniel deve ter se focado tanto em Chantelle que havia negligenciado as próprias emoções, e só agora, na sua quente, segura e aconchegante casa, na antiga garagem, pôde se dar o espaço de sentir.

“Estou aqui para você”, ela disse, acariciando seu peito suavemente com a mão. “Sempre”.

Daniel suspirou profundamente. “Obrigado. É tudo o que posso dizer”.

Emily sabia que estava sendo sincero. Obrigado era certamente o bastante para ela por ora. Aconchegou-se ainda mais forte nele e ouviu o som de sua respiração ficar mais lento, enquanto ele adormecia. Logo depois, sentiu o sono se apossar dela também.

*

Eles acordaram subitamente pelo som de Chantelle se mexendo na cama no quarto ao lado. Emily e Daniel deram um salto do sofá, desorientados pela claridade na sala. Na lareira, as cinzas ainda crepitavam.

Um instante depois, a porta do quarto se abriu um pouco.

“Chantelle?” Daniel disse. “Pode vir. Não tenha medo”.

A porta se abriu lentamente. Chantelle estava parada, usando uma das grandes camisetas de Daniel, seu cabelo loiro despenteado sobre o rosto. Apesar de não ter os cabelos escuros ou a pele olivada de Daniel, a aparência dos dois era irrefutável. Especialmente os olhos. Ambos tinham o mesmo tom de íris num azul penetrante.

“Bom dia”, Emily disse, percebendo o quanto seu corpo ainda estava rígido pelas poucas horas de sono com Daniel no sofá. “Quer que eu prepare o café da manhã para você?”

Chantelle coçou o queixo e olhou tímida para Daniel. Ele assentiu, encorajando-a, sinalizando que podia falar ali, que ninguém gritaria para ela calar a boca ou ficaria incomodado.

“Ãh-han”, Chantelle disse, com uma voz tímida.

“Do que você gosta?” Emily perguntou. “Posso fazer panquecas, torradas, ovos. Ou prefere cereal?”

Os olhos de Chantelle se abriram com a surpresa e Emily percebeu, com uma pontada dolorosa de tristeza, que ela nunca tinha tido a oportunidade de escolher antes. Talvez, nem lhe dessem café da manhã regularmente.

“Eu gostaria de panquecas”, Emily disse. “E você, Chantelle?”

“Panquecas”, ela repetiu.

“Ei, sabe de uma coisa?” Emily acrescentou. “Podíamos ir para a casa maior e tomar café da manhã lá. Tenho mirtilos na geladeira, e posso colocá-las nas panquecas. O que acha, Chantelle? Quer ver a pousada?”

Desta vez, Chantelle disse que sim com a cabeça animadamente. Daniel olhou aliviado ao ver que Emily estava assumindo a liderança naquela manhã. Emily podia ver como estava atônito com tudo aquilo, apenas pela sua expressão facial.

“Ei”, ela sugeriu, sem querer tomar o lugar que pertencia a ele, “por que não ajuda Chantelle a se vestir?”

Ele assentiu apressado, como se estivesse um pouco envergonhado por não ter pensado nisso, e então levou a garotinha de uma maneira meio tensa até o quarto, para se trocar. Emily observou-os ir, notando o quanto Daniel parecia desconfortável com essa tarefa simples da paternidade. Ela se perguntou se parte das dificuldades que ele vivenciou no Tennessee tinham a ver também com a transição para o papel de pai, se ele tinha se preocupado tanto com as questões práticas — casa, educação, alimentação — que não teve a chance de focar no fato de que agora tinha que ser pai.

Depois que todos estavam prontos, saíram da casa na antiga garagem e foram até a pousada. Chantelle ia chutando o cascalho pelo caminho, rindo com o barulho que fazia com seus sapatos. Não largou a mão de Daniel, apesar de não haver nada confortável no gesto para nenhum dos dois. Daniel parecia tenso e sem graça, como se tentasse desesperadamente não fazer nada de errado ou quebrar a criatura frágil de que agora precisava cuidar. Chantelle, por outro lado, parecia desesperada, como se nunca mais quisesse soltar Daniel, como se fazer isso lhe causasse um enorme sofrimento.

Emily não tinha certeza de como agir. Hesitante, pegou a outra mão da garotinha e ficou feliz e aliviada ao ver que Chantelle não se afastou ou puxou a mão. Ao invés, afrouxou um pouco o aperto no braço do pai.

De mãos dadas, os três subiram os degraus do terraço até a porta da frente e Emily abriu para que entrassem.

Chantelle ficou parada no batente, como se não soubesse se pertencia a um lugar assim. Olhou para Daniel, em busca de encorajamento. Ele sorriu e assentiu. Hesitante, a menina entrou na casa e Emily sentiu o coração balançar com a emoção. Lutou para não chorar.

Imediatamente, Emily teve a sensação de que Chantelle estava impressionada pela casa. Olhou ao redor, para a grande e larga escadaria com seu balaústre polido e carpete creme, para a luminária e a mesa da recepção, uma antiguidade comprada na loja de Rico. Parecia impressionada até pelos quadros e fotografias do corredor. Parecia uma criança entrando na casa do Papai Noel pela primeira vez.

Emily a levou para a sala de estar e Chantelle perdeu o fôlego ao ver o piano.

“Pode tocar se quiser”, Emily encorajou-a.

Chantelle não precisou ouvir duas vezes. Foi direto até o piano antigo, que ficava perto do janelão da sala, e começou a apertar as teclas.

Emily sorriu para Daniel. “Eu me pergunto se temos uma futura musicista nas mãos”.

Daniel observava Chantelle quase com um olhar de curiosidade, como se não pudesse acreditar que ela existia. Emily se perguntava se ele tinha tido algum contato com crianças antes. Ela havia cuidado das sobrinhas de Ben em várias ocasiões, então, tinha algum conhecimento. Daniel, por outro lado, parecia completamente perdido.

Nesse momento, Chantelle parou de tocar. O som incongruente que ela tirou do piano alertou os cães de que havia gente em casa, e começaram a latir na área de serviço.

“Gosta de cachorro?” Emily perguntou a Chantelle, decidindo que tinha que tomar a dianteira.

Chantelle assentiu com gosto.

“Eu tenho dois”, Emily continuou. “Chuva é o filhote e Mogsy é sua mãe. Quer conhecê-los?”

O sorriso de Chantelle ficou maior.

Enquanto Emily a levava pelo corredor, sentiu a mão de Daniel sem seu braço.

“É uma boa ideia?” perguntou, num sussurro, enquanto iam até a cozinha. “Não vão assustá-la? Ou morder?”

“É claro que não”, Emily tranquilizou-o.

“Mas ouvimos falar de cães devorando crianças o tempo todo”, ele murmurou.

Emily revirou os olhos. “São Mogsy e Chuva, lembra? São os cães mais tolinhos e bobalhões do mundo”.

Chegaram na cozinha e Emily apontou a área de serviço para Chantelle. No instante em que abriu a porta, viu os cães pulando e latindo para eles. Daniel ficou muito tenso ao ver Chuva correr em círculos ao redor de Chantelle, enquanto Mogsy punha as patinhas no suéter dela e tentava lambê-la. Mas Chantelle estava se divertindo como nunca. Ela se dissolveu numa nuvem de risadas felizes.

Os olhos de Daniel se abriram de surpresa. Emily soube instintivamente que era a primeira vez que ele ouvia a filha expressar tanta felicidade.

“Acho que gostam de você”, Emily disse para a menina, sorrindo. “Podemos brincar com eles lá fora, se quiser”.

Chantelle levantou para ela os imensos olhos azuis. Parecia tão feliz quanto uma criança no Natal.

“Verdade?” balbuciou. “Posso?”

Emily assentiu. “Claro”. Ela deu à menina alguns brinquedos de cachorro. “Vou observar vocês da janela”.

Abriu a porta dos fundos que levava ao quintal e os cães saíram correndo. Chantelle hesitou por um momento, insegura quanto a sair sozinha, em dar seu primeiro pequeno passo de independência. Mas, finalmente, encontrou sua autofiança, deu um passo para fora e jogou uma bola para os cães pegarem.

 

Quando Emily voltou para a cozinha, Daniel estava preparando uma garrafa de café fresco.

“Está tudo bem?” perguntou, gentil.

Daniel assentiu. “Não estou acostumado a isso. Minha maior preocupação é que ela se machuque. Queria envolvê-la em um escudo protetor macio como algodão”.

“É claro que sim”, Emily replicou. “Mas precisa deixá-la ter um pouco de independência”.

Daniel suspirou. “Como pode ficar tão à vontade com tudo isso?”

Emily deu de ombros. “Não acho que estou. Estou apenas improvisando. Ela está perfeitamente segura lá fora, desde que fiquemos de olho”.

Ela se encostou na pia da cozinha e olhou pela grande janela que dava para o quintal, onde Chantelle corria, os cães perseguindo-a, animados. Mas, enquanto observava, ficou subitmente surpresa pela semelhança de Chantelle com Charlotte, quando tinha a mesma idade. As semelhanças eram inquietantes, quase sobrenaturais. A visão fez com que outra das lembranças perdidas de Emily viesse à tona. Havia tido várias dessas lembranças espontâneas desde que se mudara para Sunset Harbor, e apesar da maneira abrupta como surgiam a deixar perplexa, ela valorizava cada uma. Eram como peças de um quebra-cabeça, ajudando-a a criar uma imagem de seu pai e da vida que tinham antes do desaparecimento dele.

Dessa vez, Emily lembrou quando teve uma febre terrível, talvez por causa de um resfriado. Só estavam os três novamente em casa, porque a mamãe não quis passar o feriadão em Sunset Harbor, então, seu pai estava dando tudo de si para cuidar dela. Lembrou-se de que um dos amigos do pai havia trazido seus cães, e que Charlotte podia brincar com eles, mas Emily estava doente demais e teve que ficar dentro da casa. Ela ficou tão chateada por não poder brincar com os cães que seu pai a havia levantado até a altura da janela – a janela da cozinha pela qual estava olhando agora – para assistir.

Emily se afastou da janela e perdeu o ar. Percebeu que estava chorando enquanto observava Chantelle se metamorfosear em Charlotte. Não pela primeira vez, teve uma forte sensação de que o espírito de Charlotte estava se comunicando com ela, de que estava de algum modo viva dentro de Chantelle e dando a Emily um sinal.

Nesse momento, Daniel aproximou-se e a envolveu nos braços. Ele era uma distração bem-vinda, então, ela reclinou a cabeça até descansar em seu peito.

“O que houve?” ele perguntou gentilmente, com uma voz que tentava acalmá-la.

Deve ter visto as lágrimas. Emily balançou a cabeça. Não queria falar com Daniel sobre o flashback, ou como sentia que o espírito de Charlotte parecia estar em Chantelle; não sabia como ele iria reagir.

“É só uma lembrança”, ela disse.

Daniel a abraçou mais forte, ninando-a de um lado para o outro. Como ele lidava com Emily nesses momentos estranhos parecia tão diferente da maneira como ele tratava Chantelle. Ele se sentia à vontade com Emily, e ela notava o quanto ficava mais confiante com ela, em comparação com sua filha. Havia se apoiado nele tantas vezes. Agora, era a vez dela ser alguém em quem ele podia se apoiar.

“Tudo isso é um pouco intenso demais, não é?” ela disse, por fim, virando para olhar para ele.

Daniel assentiu, com uma expressão angustiada. “Nem sei por onde começar. Preciso matriculá-la na escola, para começar. O segundo semestre começa na quarta-feira. Então, tenho que preparar um quarto para ela”.

“Você vai destruir suas costas se continuar dormindo nquele sofá dobrável”, Emily concordou. Então, teve uma inspiração. “Mude-se para cá”.

Daniel hesitou por um momento. “Não está falando sério. Está tão ocupada que não tem como acomodar nós dois”.

“Quero que vocês se mudem”, Emily insistiu. “Quero que Chantelle tenha espaço e o seu próprio quarto”.

“Não precisa fazer isso”, Daniel disse, ainda resistente.

“E você não precisa ficar sozinho. Estou aqui para você. Faz muito mais sentido do que ver vocês dois apertados na antiga garagem”. Ela o abraçou mais.

“Mas não pode se dar ao luxo de desistir de um dos quartos de hóspedes, pode?”

Emily sorriu. “Lembra-se de quando falamos sobre transformar a antiga garagem em um chalé, separado da pousada? Bem, agora não seria o momento perfeito? Chantelle pode ficar com o quarto ao lado da suíte, perto de nós. Pode ter sua própria chave, por segurança. Então, você pode reformar a antiga garagem a tempo para o feriado de Ação de Graças. Tenho certeza que atrairá muitos hóspedes”.

Daniel olhou para Emily com uma expressão séria. Ela não sabia de onde vinha a resistência dele. A ideia de morar com ela era tão terrível que preferia ficar naquela antiga garagem apertada?

Mas, por fim, ele assentiu. “Você está certa. A antiga garagem não é o melhor para uma criança”.

“Você vai se mudar para a minha casa?” Emily disse, levantando as sobrancelhas, animada.

Daniel sorriu. “Sim”.

Emily jogou os braços ao redor do namorado e sentiu que ele apertou ainda mais o abraço.

“Mas juro encontrar uma maneira de ganhar dinheiro, para poder nos sustentar”, Daniel disse.

“Pensaremos nisso em outra hora”, Emily disse. Estava feliz demais para pensar em detalhes. Tudo o que importava naquele momento era que Daniel iria morar com ela, e que tinham uma criança para amar e cuidar. Eles seriam uma família e Emily não podia estar mais feliz.

Então, sentiu seu hálito morno enquanto ele sussurrava em seu ouvido. “Obrigado. Do fundo do meu coração. Obrigado”.

*

“Então, você gostaria que este fosse seu quarto?” Emily perguntou.

Estava de pé com Chantelle na porta de um dos quartos mais adoráveis de toda a pousada. Daniel estava logo atrás delas.

Emily observou Chantelle se encantar com o quarto. A menina largou a mão de Emily e caminhou lentamente pelo cômodo, cuidadosa, como se não quisesse quebrar ou tirar nada do lugar. Foi até a grande cama com seus lençois limpos, carmim, e tocou-os com os dedos, levemente. Então, foi até a janela e olhou pelos jardins até o mar, cintilante, acima dos topos das árvores. Emily e Daniel observavam com a respiração suspensa enquanto a garotinha caminhava em silêncio pelo quarto, pegando suavemente o abajur e então devolvendo-o, e em seguida espiando dentro dos guarda-roupas vazios.

“O que acha?” Emily perguntou. “Podemos pintar as paredes se não gosta delas brancas. Mudar as cortinas. Pendurar algumas fotos suas”.

Chantelle se virou. “Adorei, do jeito que está. Posso mesmo ter um quarto?”

Emily sentiu Daniel ficar tenso atrás dela. Soube imediatamente o que estava pensando: que Chantelle, aos seis anos, nunca teve seu próprio quarto; que a vida que teve até agora tinha sido cheia de dificuldades e marcada pela negligência.

“Claro que pode”, Emily disse, sorrindo. “Porque não traz suas coisas para cá? Então, vai começar a sentir que realmente é seu quarto”.

Chantelle concordou e foram todos juntos pegar as coisas dela, na antiga garagem. Mas ao chegarem lá, Emily ficou chocada ao descobrir que a menina havia trazido apenas uma mera mochila.

“Onde estão as coisas dela?” perguntou a Daniel discretamente, enquanto voltavam para a casa.

“É tudo o que havia lá”, Daniel replicou. “Ela não tinha quase nada na casa do tio de Sheila. Perguntei e me disse que havia deixado tudo para trás quando foram despejadas”.

Emily ficou sem palavras. Partia seu coração pensar sobre as coisas terríveis pelas quais Chantelle passou em sua curta vida. Mais do que qualquer outra coisa, queria garantir que a menininha agora teria a chance de florescer e deixar o passado para trás. Emily esperava que, com amor, paciência e estabilidade, Chantelle poderia se recuperar do terrível começo em sua vida.

No novo quarto de Chantelle, Emily pendurou as poucas roupas que ela tinha nos cabides. Só havia dois pares de jeans, cinco camisetas e três suéteres. Não tinha meias suficientes para uma semana inteira.

A menina ajudou a arrumar suas calcinhas nas gavetas da cômoda. “Estou muito feliz por ter pais agora”, Chantelle disse.

Emily se sentou na ponta da cama, disposta a encorajá-la a se abrir. “Fico feliz em ter uma menininha adorável como você para passearmos juntas”.

A criança corou. “Quer mesmo passear comigo?”

“É claro!” Emily disse, um pouco surpresa. “Mal posso esperar para levá-la até a praia, passear de barco, brincar de jogos e jogarmos bola juntas”.

“Minha mãe nunca quis brincar comigo”, Chantelle disse, com uma voz tímida.

Emily sentiu o coração apertar. “Sinto muito ouvir isso”, ela disse, tentando não deixar a dor em seu coração transparecer na voz. “Bem, poderá brincar de muitas coisas agora. O que gostaria de fazer?”

Chantelle apenas deu de ombros, e ocorreu a Emily que sua criação havia sido tão sufocante que nem podia pensar em coisas divertidas para fazer.

“Aonde o papai foi?” ela perguntou.

Emily olhou sobre o ombro e viu que Daniel havia desaparecido. Ela, também, ficou preocupada.

“Provavelmente só foi pegar mais café”, Emily replicou. “Ei, tenho uma ideia. Por que não vamos até o sótão trazer alguns ursinhos de pelúcia para seu quarto?”

Ela havia cuidadosamente empacotado e guardado todos os seus brinquedos antigos, e também os de Charlotte, retirados do quarto interditado após a morte da irmã. Chantelle estava numa idade próxima à delas quando o quarto foi fechado, então, muitos dos brinquedos seriam adequados para ela.

O rosto de Chantelle se iluminou. “Você tem ursos de pelúcia no sótão?”