Atração De Sangue

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Quando saí do alçapão, estava num edifício abandonado, com as paredes cheias de mofo e grandes janelas.

Lá fora já estava escuro e continuava a chover.

«Mas que horas são?» perguntei desorientada.

Quando entrei na abadia faltava pouco para o almoço e agora como é que já estava escuro?

Talvez houvesse um eclipse.

«São quase cinco»

«O quê? Mas como é possível?»

«Estiveste escondida naquele buraco com aquele gato nos braços a chorar e acabaste por adormecer. Dormiste por três horas antes de acordar. Nem te apercebeste da minha presença» explicou-me, fazendo-me corar de vergonha. Viu-me chorar, um luxo que não concedo nunca, com exceção de algumas ocasiões.

Só a tia me tinha visto chorar uma vez e isso me tinha deixado muito chateada na época.

Não deixava que ninguém visse as minhas fraquezas e agora senti-me perdida diante do olhar do Blake que me tinha visto naquele estado.

Provavelmente tinha também os olhos vermelhos e o rosto ainda pálido, como acontecia sempre depois de ter chorado.

«Quem sabe o monstro que eu estou agora?» desdramatizei.

«Não sei. É a primeira vez que vejo alguém chorar. Geralmente, as pessoas gritam e suplicam-me para que eu as poupe, não choram a pensar na tia ou na sua casa» respondeu-me olhando-me com um ar interrogativo.

«E tu como sabes isso?» perguntei-lhe tratando-o por tu.

«Falavas no sono. Continuavas a repetir tia, Ahmed, casa, quinta, vampiros. Também falaste no meu nome» informou-me, agarrando no seu telemóvel e enviando uma mensagem sabe-se lá a quem.

Sabia que falava enquanto dormia. A tia mo dizia sempre.

Foi sempre algo que me envergonhou e naquele momento fiquei ainda mais vermelha.

«Então, onde vamos?» perguntei-lhe para distraí-lo de mim, uma vez que começou a olhar-me curioso.

Esta pergunta fê-lo voltar a ficar sério.

«À minha casa».

«Onde?» voltei a perguntar estupefacta.

Blake não teve tempo de dizer mais nada, um clacson na estrada buzinou inesperadamente.

«São eles. Vamos» disse-me, voltando a agarrar-me pelo braço.

«Eles quem?»

«Vampiros, obviamente».

«Olha que para mim, um dá e chega. Não é preciso...» tentei fazê-lo mudar de ideias quanto a dar-me a comer aos seus amigos, mas ele soltou uma estrondosa gargalhada, que quebrou todas as minhas defesas.

Não podia acreditar. Tinha-o feito rir.

«Não tenho nenhuma intenção de partilhar-te com os meus amigos, se é isso que pensas» assegurou-me num tom de voz claro.

Levou-me à saída do edifício, avisando-me para não fazer cenas, uma vez lá fora.

«Os meus amigos não gostam de contratempos» aconselhou-me.

Obedeci.

Saímos. Estava a parar de chover.

Estávamos no centro da cidade, no meio de diversos passantes. Como é que ninguém se apercebia do perigo que corria ao passear tranquilamente pelas estradas de uma cidade apinhada de vampiros?

Deixei-me arrastar até um Ford azul, estacionado mesmo à nossa frente. Nos lugares de trás estavam duas pessoas, ou melhor vampiros. Ambos eram pálidos e loiros. O que ia ao volante era muito gordo e velho.

Tive muita vontade de correr pela estrada e afastar-me, mas a mão de Blake era muito forte.

«Nem tentes» disse-me. Será que conseguia ler o pensamento?

Num instante, Blake abriu a porta do carro e fez-me acomodar no banco detrás, sentando-se depois perto de mim.

Mal a porta se fechou, o condutor pôs o carro em andamento sem sequer pedir indicações acerca da direção, enquanto o outro vampiro ao seu lado começou a olhar-me fixamente.

Entretanto o carro partiu a toda a velocidade, fazendo-me balançar para a direita e para a esquerda, levando-me, a dada altura, a bater contra o braço do Blake, que acabou por tranquilizar-se com a minha instabilidade e decidiu abraçar-me contra ele.

Contudo, desta vez o seu aperto foi firme, mas delicado.

Encontrava-me com o rosto encostado à sua camisa, logo onde estava desabotoada.

Sempre tive um ótimo olfato e não podia não sentir o seu perfume, tão masculino e sensual.

Estava prestes a me deixar levar por aquela sensação descuidada de perigo, quando algo me chamou a atenção. O homem sentado à frente olhava-me intensamente.

«Blake, esta rapariga humana tem um odor fortíssimo! Nunca senti um cheiro desde tipo vindo de um humano. É mesmo avassalador. Está-me a deixar maluco!» o homem desabafou inesperadamente.

Inicialmente, preocupei-me por não me ter lavado bem naquela manhã, apesar do duche que tomei.

Depois, ao notar como o vampiro lambia os lábios, comecei a assustar-me seriamente. Involuntariamente escondi-me ainda mais no peito do Blake, que se apercebeu imediatamente do meu desconforto.

«Will, pára com isso!».

«Por favor, não digas que não te apercebeste do seu perfume» provocou-o.

«Apercebi-me. É particular. Eu também levei algum tempo antes de poder aproximar-me sem atacá-la, mas depois habituas-te» procurou tranquilizá-lo Blake, mas o outro vampiro parecia cada vez mais voraz e próximo.

Continuava a esticar-se sobre o banco da frente para cheirar-me melhor.

O meu coração começou a bater fortemente de medo.

Percebi demasiado tarde que aquela sensação o excitava ainda mais.

Num instante, dei por mim a ser agredida pelo Will que tentou atacar-me o pescoço com os caninos alongados e o olhar hipnotizado. Por sorte o Blake interveio mesmo a tempo e segurou-o pelo pescoço, antes que este pudesse chegar a mim.

«Controla-te!» gritou-lhe o Blake furioso.

«Não consigo! Este cheiro é demasiado forte» gritou por sua vez Will debatendo-se.

«Lembra-te daquilo que nos disse o cardeal Montagnard. O seu sangue é uma arma contra nós. Quero consultar Jack Marley antes de transformá-la em vampiro ou fazer outra coisa qualquer» avisou-o e Will voltou ao seu lugar.

Então era verdade que o cardeal Montagnard lhe tinha contado algo sobre mim. Ainda bem que lhes tinha avisado para não me morderem, assim podia ganhar tempo.

Estava ainda perdida nos meus pensamentos, quando o carro parou em frente a um antigo edifício abandonado com pequenas janelas.

Fui de novo tomada pelo medo de estar presa sozinha naquele casebre.

«Por favor, Blake, sai depressa e leva contigo essa rapariga antes que lhe salte em cima também eu» disse-nos o condutor, que até aí não tinha aberto a boca.

«Sim, desculpa. Obrigada, Peter» cumprimentou-o Blake, saindo do carro e ajudando-me a descer.

Dirigimo-nos para o edifício sombrio. Blake continuou a agarrar-me pelo braço, mesmo quando abria a porta de metal com as chaves que tirou do bolso do impermeável.

Fora do carro, fazia muito frio e comecei a tremer uma vez que trazia uma simples camisola de mangas compridas e um casaco de ganga, bastante leve.

Pouco depois fui levada para o interior da estrutura. Fiquei maravilhada pelo cenário com que me deparei.

Estava de repente num grande apartamento luxuosíssimo e aquecido. Havia um grande salão, com um grande sofá em pele branco virado para a parede, na qual estava encaixado um televisor plasma de cinquenta polegadas.

As paredes estavam decoradas com diversos quadros de variadas dimensões.

Por trás da sala, via-se uma cozinha moderna de forma arredondada. À esquerda, distinguia-se uma enorme mesa de doze lugares com outras tantas cadeiras, enquanto à direita, entre a sala e a cozinha, era possível vislumbrar uma espaçosa casa de banho, meio escondida por portas de vidro colorido e fosco.

Por cima da casa de banho, estava um pequeno sótão, no qual se distinguia uma cama.

Todo o apartamento tinha sido decorado com um estilo industrial, como se podia notar pela forma das cadeiras, do sofá, da escada que conduzia ao sótão e da cozinha elétrica com o balcão em aço.

«Este lugar é lindíssimo!» exclamei, ao caminhar lentamente no interior daquele grande open space.

«És a primeira pessoa a dizê-lo» admitiu Blake, deixando-me espantada. Não podia acreditar.

«Ficarás aqui por alguns dias, por isso põe-te cómoda. Nunca tive hóspedes não vampiros, por isso se precisares de alguma coisa, pede à vontade» acrescentou depois, tirando o impermeável. De repente, senti-me um hóspede e não uma prisioneira.

Também Blake pareceu-me mais relaxado e sem nenhuma intenção de fazer-me mal, assim fiz-lhe a vontade fingindo estar cómoda. Para além disso, não acreditava que me quisesse fazer mal, caso contrário já me teria matado na cripta ou não me teria certamente salvado do Will. Uma pequena parte de mim, sentia-se segura com ele, ainda que não soubesse até quando.

Sentei-me com calma no sofá em pele branco.

Mal apoiei-me naquele sofá macio, dei-me conta do cansaço e das dores nos músculos que sentia. Encostei-me às costas do sofá, respirando profundamente.

«Queres ir à casa de banho refrescar-te?» perguntou-me, tentando esconder o seu desconforto com a amabilidade.

Surpreendeu-me muito esta sua mudança e por instantes pensei que não seria um animal bárbaro tendo aquela habilidade.

Acima de tudo, até ao momento, ainda não tinha mostrado que queria fazer-me mal. Aparentemente parecia ser melhor do que aquilo que me tinha descrito o cardeal Siringer. De certeza que era menos perigoso que o Will.

Precisava mesmo de um banho, mas não me atrevia a depositar assim tanta confiança.

Levantei-me do sofá e notei imediatamente que tinha deixado uma enorme mancha suja na pele branca. Tinha dormido durante horas naquele buraco na cripta. Como pôde pensar que não estava assim tão porca?

 

Se estivesse em casa com a tia, seria repreendida.

«Oh, meu deus! Sujei o sofá. Peço desculpa, de verdade. Se me deres uma esponja, eu...» tentei pedir desculpa imediatamente com um ar culpado. Tinha acabado de arruinar o seu paraíso perfeito e temia que o tivesse irritado.

«Está calma. Eu trato disto. Tu lavas-te que, entretanto, eu encomendo o jantar»

«Porquê? Vocês vampiros comem?» deixei escapar sem me dar conta.

«Geralmente não, mas tu sim, suponho. Tens preferências?»

Queria recusar, mas os rumores da minha barriga e o cansaço levaram a melhor.

«Carne vermelha, se possível» gaguejei envergonhadíssima, dirigindo-me à casa de banho, perguntando-me se me iria envenenar.

«De acordo» disse-me, ao tirar o telemóvel do bolso das calças.

Entretanto, fechei-me na casa de banho. Os azulejos eram verdes, como os do pavimento, se bem que de uma tonalidade mais clara.

Podia escolher entre a banheira ou o chuveiro.

Escolhi a coisa mais rápida. Não queria ficar muito tempo naquele banho e depois as paredes opacas do chuveiro proteger-me-iam de possíveis indiscrições.

Despi-me rapidamente e meti-me depressa dentro do chuveiro. O jato de água quente caiu-me sobre a cabeças e as costas, relaxando-me instantaneamente.

Permaneci muito tempo debaixo daquele jato antes de usar o shampoo com perfume de carvalho que encontrei na beira da banheira.

Esfreguei o sabão em mim com calma, mimada por aquele perfume que me recordava vagamente aquele de Blake.

Apercebi-me de estar tão cansada e trastornada que não consegui estar assim tão alerta como queria e devia.

Depois de limpar-me, saí com cautela do chuveiro e apercebi-me que o Blake tinha pendurado duas toalhas e roupa limpa, mas enorme, na borda da banheira: uma camisola verde e calças desportivas pretas que se apertavam com um laço na parte inferior.

Provavelmente queria certificar-se que não voltava a fazer porcaria, como a do sofá.

Vesti-me rapidamente e saí do banho com os cabelos ainda molhados, que me escorriam sobre as costas.

As roupas tinham o cheiro do Blake e aquele odor cobriu-me num ternurento abraço. Apesar de ser um vampiro, Blake tinha realmente um bom perfume. Era a primeira vez que estava em contato com a intimidade de um homem: a sua casa, a sua roupa, o seu perfume...

Mal entrei no salão, viu-o atrapalhado com o fogão e a esvaziar dois sacos de compras, que estavam apoiados no balcão da cozinha.

Aquela atmosfera tão familiar, quase íntima que se tinha formado, tranquilizou-me, por isso, decidi aproximar-me.

Além disso, a tia Cecília dizia sempre que se obtinha mais coisas com boas maneiras, logo, decidi comportar-me de forma gentil.

«Cá estou! Precisas de ajuda?» perguntei, vendo-o com dificuldades em acender o gás.

Blake ficou a olhar fixamente para o fogão, antes de virar-se para mim. Tinha um olhar indecifrável, mas ficou a observar-me durante muito tempo. Por fim, aproximou-se, agarrou uma madeixa dos meus cabelos molhados e com um movimento muito lento começou a brincar com eles. Parecia hipnotizado, como eu estava pelos seus olhos magnéticos e pela inesperada carícia, que me fez arrepios por toda a coluna.

Depois, de repente afastou a mão de mim, como se se tivesse queimado por aquele contato e continuou a olhar fixamente a sua cozinha imaculada.

«Estás a pingar o chão. O secador está no armário debaixo da pia» murmurou com um tom de voz aborrecido, mas ao mesmo tempo perturbado.

Resmunguei uma espécie de desculpa e fui a correr para a casa de banho buscar o secador. Enxuguei o cabelo o mais rápido possível, tentando penteá-lo como podia.

«Trouxe-te isto» ouvi uma voz atrás de mim, que fez-me saltar de susto.

Voltei-me e estava de frente com o Blake. Estava a passar-me uma bolsa.

«Peter, o homem que nos guiou para cá, trouxe-te umas coisas pensando que te poderiam ser úteis» disse-me.

Peguei no saco e abriu-o. Tinha um pente, uma escova de dentes, um creme hidratante e um pacote de pensos.

«Obrigada» sussurrei, mas Blake já tinha saído da sala.

Penteei-me à pressa, deixando que os cabelos me caíssem macios sobre as costas.

Depois de ter-me preparado, senti-me muito melhor.

Meti também um penso no joelho ferido e fui ter com o Blake.

Mal me viu, informou-me imediatamente acerca do jantar.

«Mandei o Peter comprar de comer. Espero que corra tudo bem. Mandei-o porque foi transformado em vampiro há poucos anos e conhece bem os hábitos atuais.»

Espreitei para dentro dos sacos.

Estavam lá vários congelados, um preparo para puré de batata e quatro grandes e espessos bifes de vaca.

Uma vez que via Blake completamente perdido, decidi tomar conta da situação.

Agarrei imediatamente na carne e pôs-me a procurar uma frigideira.

Felizmente, encontrei-a juntamente com pratos, talheres e copos.

Peguei no que era necessário e preparei a mesa.

Mostrei ao Blake como acendia o fogão.

«Primeiro tens que virar o botão e depois premir o botão para ligar, vês?».

A seguir aqueci bem a frigideira e coloquei dois bifes. O cheiro da comida abriu-me uma brecha no estômago. Tinha uma fome terrível.

Fi-los cozer pouco. Gostava deles malpassados.

Por fim, posei o meu prato na mesa e sentei-me, pronta a deliciar-me com aquele bife.

Blake sentou-se perto de mim e começou a observar-me intrigado.

Debaixo do seu olhar inquisidor cortei a carne com a faca, deixando que o sangue do seu interior escorresse no prato.

Parecia manteiga, tal forma era tenra.

Meti na boca um grande bocado e saboreei aquele gosto a que estava habituada há anos, mas que definia sempre como delicioso.

Reparei imediatamente no olhar de novo indecifrável de Blake. Era impossível saber em que estava a pensar.

«Queres um pouco?» perguntei-lhe para quebrar o gelo.

Acenou com a cabeça «Devo admitir que observar-te, também me deu vontade de provar esse bife. Há seculos que não toco em comida normal».

Tentei ignorar o significado daquela última frase e concentrei-me em cortar um bocado da minha carne e metê-la num prato.

Fiquei maravilhada pelos seus modos refinados e elegantes de cortar a carne e levá-la à boca, mastigando-a lentamente.

«Boa» admitiu depois de ter engolido um bocado.

Sorri-lhe satisfeita, continuando a comer.

«Não te repugna todo este sangue?» perguntou-me outra vez.

«Nem por isso. Estou habituada. Em casa como-a todos os dias» revelei.

«Também és uma vampira?» provocou-me.

«Não, sou anémica» expliquei com um tom de voz ligeiro.

«Não é verdade» declarou com um tom de voz firme e o olhar desconfiado.

«Garanto-te. Tenho uma forma muito rara de anemia, que me enfraquece muitíssimo. Por isso, tenho que seguir uma determinada dieta. Sempre foi assim desde que nasci» contei, esperando não revelar nada comprometedor.

«Tu não és anémica» confirmou convicto.

«Digo-te que sim».

A sua determinação começou a deixar-me nervosa.

«Não tens o cheiro de um anémico, fraco e insípido. Pelo contrário, o teu é intenso e persistente. É tão forte que se sente ao longe. Foi precisamente devido a esta tua característica que consegui encontrar-te rapidamente naquela cripta. Portanto, não és anémica».

«Em vez sim».

«Não».

«Sim».

Aquela conversa estava a começar a deixar-me em crise.

A tia não me mentiria sobre algo do género, mas é também verdade que nos últimos dias descobri que muitas das coisas que tinha sempre acreditado, eram apenas um monte de mentiras.

Todavia não podia acreditar que também esta fosse uma aldrabice. Eu ficava realmente mal e me enfraquecia facilmente se não tomava as minhas hemodoses. Tinha que ter forçosamente uma anemia.

Mas e se tivesse algo mais grave?

A tia não me mentiria sobre isto!

Estava perturbada por esta dúvida que estava sementada na minha mente. Não, não era possível! Mas...

Senti os olhos encherem-se de lágrimas. Mais um pouco e teria cedido. Ergui-me e o Blake fez o mesmo.

Com toda a força que me restava no corpo, gritei-lhe com desprezo: «Mas o que te interessa, vampiro? Eu sou anémica. Fim da discussão».

Por um instante Blake olhou-me incrédulo, mas recuperou depressa e procurou irritar-me imediatamente.

«Está bem, não vás pensar em chorar outra vez» provocou-me, ao ver-me à beira das lágrimas.

Noutras circunstâncias, iria me recompor orgulhosa e não faria caso daquelas provocações manipuladoras, mas naquele momento, depois de um dia tão arrasador, a minha mente não foi assim tão reativa.

Agi sem pensar e dei-lhe um estalo em cheio no rosto com toda a força que tinha no corpo. Naquele gesto estavam todo o meu desespero e a minha raiva. Era tudo culpa sua se me encontrava naquela situação!

Durante um longo segundo Blake não mexeu um músculo, enquanto deixei espaço às lágrimas. Era a primeira vez que batia em alguém e estava transtornada. Tremia de raiva e de frustração.

De repente, Blake agarrou-me os braços com dois braços letais, emitindo um rugido feroz que me parou a respiração, enquanto aproximava o seu rosto tenso de raiva ao meu, fixando-me com os olhos gelados e ameaçadores. Vislumbrei os seus caninos alongados surgirem da boca.

Dei-me conta do que tinha feito e senti-me ir abaixo.

Tentei libertar-me das suas garras, mas foi impossível.

«Não queria...» sussurrei com um tom de voz baixo com o olhar fixo nos seus dentes.

Senti por um instante o seu apertão ainda mais insistente, mas depois deixou-me, afastando-me violentamente dele.

«Vai-te embora» rosnou, indicando-me o quarto de dormir no sótão.

«Eu...»

«Vai-te embora!» gritou-me furioso, fazendo-me sobressaltar.

Sem deixá-lo repetir novamente, corri para as escadas e refugiei-me no quarto completamente aberto ao piso inferior.

A cama estava precisamente colocada ao lado do corrimão de metal e daquela posição era possível ver todo o apartamento de cima: o televisor, o sofá, a cozinha.

Sem despir-me, enfiei-me debaixo do cobertor preto da cama.

Aproximei-me do parapeito. Podia ver o Blake que levantou os pratos e depois deitou-se no sofá.

Acendeu a televisão que estava na parede em frente e deixou que uma imagem passasse no ecrã sem som.

Permaneceu durante muito tempo deitado no sofá com os olhos fechados, sem olhar o ecrã.

Não pude evitar admirar a sua beleza.

Para além do físico jovem, perfeito, elegante, harmonioso com as ancas estreitas e as costas largas, tinha um rosto estupendo. Os cabelos negros brilhantes, a pele clara, o nariz direito, os lábios sensuais e os olhos azuis, que não conseguia parar de olhar fixamente.

Eram olhos muito mais claros e frios que os do Kevin, mas mais fascinantes e charmosos.

Não podia acreditar. Tinha acabado de o comparar com o Kevin, o amor da minha vida. Como fui capaz?

E ainda assim, naquele momento, o Kevin pareceu-me tão longe e pequeno. Quem sabe se se questionava acerca do que me teria acontecido?

Não percebi o motivo, mas naquele momento não me interessava muito.

O padre Dominick tinha mesmo razão quando me dizia que me sentia apenas atraída pelo Kevin, mas que o amor era outra coisa. Quem sabe se algum dia irei realmente amar intensamente alguém?

Com estes pensamentos e continuando a olhar fixamente o Blake, deitado imóvel no sofá, adormeci.

Sonhei que o Kevin me chamava. Tentava alcançá-lo e quando finalmente consegui abraçá-lo, descobri que era o Blake.

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