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Oliveira Martins: Estudo de Psychologia

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III
AS THEORIAS

Qual é a sua concepção do mundo? qual o seu processo de invenção? qual o seu methodo de prova? qual a quantidade a qualidade e a ligação das suas idéias geraes? Eis as perguntas que um critico deve fazer sempre que queira ter uma percepção clara da razão do escriptor que analysa.

Á portada do seu livro O Hellenismo e a Civilisação christã ha uma theoria digna de attenção, menos pelo seu valor intrinseco de verdade ou novidade do que pela sua importancia como indicio do espirito que a formulou. É a theoria do Acaso. Em presença da realidade historica, como em presença da realidade natural, o Sr. Oliveira Martins é ferido pelo caracter eminentemente concreto que ella apresenta. A infinita complexidade propria das cousas e que imprime a cada uma um caracter de individualidade, não escapa á sua observação. Na sciencia, pensa elle, o necessario e o fortuito tem uma funcção igualmente inevitavel. É certo que o Sr. Oliveira Martins não confunde o fortuito com o milagroso, que justamente regeita como irracional. Mas admittindo ser impossivel explicar um caso qualquer na sua totalidade, elle introduz um elemento d'ignorancia mesmo n'aquella porção da Realidade que é confessadamente do dominio da sciencia positiva. É isto que a sua notavel theoria do Acaso enuncia com a lucidez propria das operações abstractas. Os factos apparecem-lhe certamente formando series e ligados entre si pelo nexo da causalidade. Mas o encontro d'essas series determina nos pontos de intersecção a apparição de novas formas de realidade, cuja existencia a sciencia não póde explicar, visto o encontro das series não ser necessario, e cujos aspectos o investigador se deve limitar a descrever, abandonando aqui a razão abstracta, instrumento adequado á descoberta das leis geraes, pela imaginação poetica, visão sufficiente da existencia concreta.

Sem entrar na discussão desenvolvida d'esta theoria, a meu ver inexacta, não posso deixar de me demorar um instante com ella. A introducção da noção de Acaso como elemento constitutivo da Realidade, quer se considere o Acaso como ausencia de leis, quer seja apenas synonymo de contingencia no encontro das series naturaes expressas por essas leis, significa sempre uma abdicação confessada ou tacita da Razão. A previsão dos casos futuros, aferidora da solidez das verdades adquiridas, torna-se tão impossivel n'um universo em que a ausencia de causalidade implica uma constitucional e incuravel anarchia, como n'um mundo em que os factos apparecem, sim, ligados por um nexo abstracto de causalidade, mas em que as cousas são aggregados contingentes, resultantes da intercorrencia de series independentes. A coherencia parcial representada pela existencia d'essas series é inutilisada pela ausencia de uma connexão natural que ligue as series n'um systema, resultando d'ahi uma incoherencia effectiva como a que torna um cahos o mundo concebido pela philosophia de Stuart Mill. Os resultados de uma tal doutrina fazem-se sentir logo; e não é difficil dizer porque occorrem ás vezes á penna do Sr. Oliveira Martins expressões singulares, que levariam a suspeital-o de scepticismo intellectual, se o corpo das suas opiniões não desmentisse uma tal hypothese, e se o proprio auctor não corrigisse o que as suas expressões possam conter de excessivo. Copiarei do prefacio do Portugal contemporaneo estas linhas para exemplo: «O profundo e inabalavel reconhecimento das causas que fazem dos homens os instrumentos do acaso ou do destino!..» N'este trecho está como que visivel toda a theoria. A affirmação das causas não exclue a admissão do Acaso e uma extranha reserva coexiste com um dogmatismo energico.

A theoria acima exposta contém certamente alguma cousa de verdadeiro; para que fosse absolutamente exacta seria preciso completal-a pela affirmação de uma solidariedade estructural entre as partes e de uma unidade systematica no todo universal. Affirmação esta que tem o seu fundamento quer na doutrina da communidade d'origem e identidade latente dos elementos da Realidade, quer na philosophia que vê na idéia de Systema como no conceito de Causa formas condicionaes do pensamento. Admittindo qualquer d'estas hypotheses, o Sr. Oliveira Martins não se privava do direito de se conservar n'uma prudente reserva em frente da esmagadora complexidade das cousas concretas, antes lhe seria facil motivar a sua abstenção com a impossibilidade em que se acha o espirito de exgottar por analyses successivas a quantidade infinita de elementos que entram na formação do mais insignificante phenomeno. De maneira que esta impossibilidade de explicação completa proviria não de uma falta de coherencia entre as series causaes, mas de um excesso d'ella. Fundada nestas duas idéias, o Universo e o Individuo, é possivel proceder á construcção da sciencia positiva. Para conseguil-o deve-se ainda recorrer a principios subsidiarios. Não entra no programma d'este estudo enuncial-os. Diga-se porém que a noção de jerarchia de causas e a comparação entre grandezas de forças são instrumentos adequados á resolução do problema.

Seja porém qual for o valor doutrinal d'esta theoria, ella nos interessa como documento do espirito que analysamos. Vê-se que o Sr. Oliveira Martins encontra na realidade dois principios, um necessario, outro fortuito. Quanto ao primeiro o nosso auctor exprime-se categoricamente; e investe-o de certeza absoluta; e no fim do seu livro a Anthropologia escreve o seguinte: «A logica dipensa os prolegomenos da physiologia; e todos os progressos passados ou vindouros da anatomia do cerebro não alteraram, nem alterarão uma linha só do systema das suas leis. Podemos affirmar com afouteza que o que torna certa para nós uma proposição, a tornaria egualmente certa para intelligencias tão bem munidas de conhecimentos como a nossa: embora com a indispensavel capacidade organica, tivessem uma constituição physiologica differente. Com algumas circumvoluções mais ou menos no cerebro talvez se não seja capaz de comprehender a geometria; mas, sendo-se, a geometria não poderá ser diversa da que nos ensinaram Euclides ou Archimedes.» Esta peremptoria affirmativa nos revela uma intelligencia que por natureza ou por systema, se não deixa immergir nas nevoas da duvida. Quanto á admissão de um elemento fortuito na realidade, é conveniente observar que o Sr. Oliveira Martins não só o confessa mas ainda o pratica. Com effeito nas suas narrações e deducções elle foge ás explicações que se contentam com uma só causa; as suas previsões são cheias de restricções. Pegar n'um trecho da realidade, despil-o de tudo quanto for accessorio, decompol-o n'um pequeno numero de elementos constitucionaes, referil-os a um pequeno numero de causas simples, subordinar todas estas causas a um só principio explicativo que é razão sufficiente de todo o grupo estudado, partir do trabalho feito para formular previsões imperiosas semelhantes a ordens dadas ao futuro, são actos proprios das intelligencias simplistas e centralistas, de que offerecem um excellente exemplo entre nós os primeiros escriptos do Sr. Theophilo Braga. O Sr. Oliveira Martins procede de um modo bem diverso. Elle multiplica os pontos de vista, não poupa principios novos para explicar novas formas de existencia, foge de theorias demasiado simples, e quando formula uma lei só admitte a sua futura realisação sob certas condições, abstendo-se de uma excessiva confiança na sciencia como explicação do presente ou previsão do porvir. Sem tomar as interminaveis precauções, nem ter a delicadeza infinita de um Ernesto Renan, por que lh'o não permitte o temperamento nimiamente apaixonado da raça, a sua prudencia é grande e seria efficaz, se a não prejudicasse o seu exaggerado e contumaz espirito de improvisação. Assim como é, não se torna porém difficil mostrar a relação que prende os seus habitos d'intelligencia á sua concepção da realidade.

Nem é menos facil apontar o nexo logico que liga a concepção exposta e as tendencias indicadas ao seu habitual e confessado processo de indagação. «Não bastam á historia, diz elle, a observação e o systema classificador, assim como á sua lingua, não bastam a precisão e a clareza; é mister sentir e adivinhar e por no estylo a vida e o calor proprios das cousas moraes». E accrescenta: «O historiador não reproduzirá a sociedade, se não poder combinar no seu espirito o raciocinio que descreve, a intuição que vê a alma que sente.» É mister sentir e adivinhar diz o Sr. Oliveira Martins e é o que elle faz de preferencia. Alguns verão n'estas palavras um paradoxo ou uma ironia. Mas as pessoas versadas no assumpto sabem que ha duas maneiras de inventar: Ou se parte da observação das causas e por um laborioso processo de raciocinio se sobe aos principios mais geraes que as explicam, ou por uma immediata e impetuosa improvisação se descobrem estes mesmos principios sem passar por todas as intermediarias logicas que são os seus antecedentes naturaes. D'estas duas classes de intelligencias, uma fadada para a grande descoberta inconsciente, outra predestinada para a perfeita prova efficaz, e que mutuamente se completam, porque se uma é a invenção, a outra é a demonstração, o Sr. Oliveira Martins pertence á primeira, isto é, apparece-nos antes como um poeta, do que como um orador. Certamente elle estuda os assumptos de que trata, mas vê-se que as suas theorias derivam menos da erudição que da intuição. Póde-se dizer que elle adivinha, se entendermos por adivinhação, não uma milagrosa apprehensão de principios impossiveis de descobrir por meios naturaes, mas uma veloz e certeira descoberta de verdades que seria lento e penoso investigar pelo raciocinio ordinario. O nosso auctor pertence, salvo as differenças de grandeza, a essa classe d'espiritos, de que são excellentes exemplares Michelet na França, Carlyle na Inglaterra, e na Allemanha tantos Allemães. É antes um poeta, do que um orador. Porque os attributos proprios da razão oratoria, o instincto da ordem, o habito da symetria, o emprego das verdades claras e equidistantes, a contextura equilibrada e a velocidade uniforme do discurso, a abundancia de argumentos e a efficacia de provas, não são visiveis nos seus livros. Pelo contrario, os dons propriamente poeticos, a veracidade e a intensidade da visão concreta, a energia da imaginação instantanea e intermittente, o vôo desigual e tortuoso do raciocinio, o emprego da inspiração, e da paixão como processos de descoberta e exposição, saltam aos olhos de quem o estuda. Este genero de espirito é fadado, pela sua estructura, ás verdades importantes e aos erros frequentes, e nem umas, nem os outros faltam nos trabalhos do Sr. Oliveira Martins.

 

D'entre os dotes oratorios acima indicados, e cuja falta notei no Sr. Oliveira Martins, um dos mais importantes é certamente o talento e o gosto da prova; qualidade esta cuja importancia sobe de ponto, se observarmos que a prova é não sómente um instrumento da eloquencia, mas ainda um elemento da sciencia. Quem o leu, observou de certo, que elle se contenta com expor as idéias, muitas vezes novas, sempre interessantes, que lhe occorrem nas suas explorações atravez da Historia, sem procurar fundamentar as suas theorias, e tornar evidente aquillo que considera como verdadeiro. E não só esta ausencia de provas é visivel em questões theoricas, mas ainda em materia de factos. Certamente as narrações do Sr. Oliveira Martins tem um cunho d'extrema verosimilhança. Artista pela visão das massas e pelo sentimento dos conjunctos, elle sabe adequar os pequenos factos que escolhe ao effeito final que deseja, e nos seus livros a harmonia do todo garante a veracidade das partes. Mas salvo esta garantia que é commum ao romance que se imagina, como á historia que se narra, nada merece nas suas obras o nome de demonstrado. Nem a immensa accumulação dos factos averiguados, nem a enumeração completa dos documentos compulsados, nem a discussão e a critica das fontes exploradas, vem dar á sua narração o cunho da certeza. Entrando num assumpto vai direito ao amago d'elle, e depois de traduzir a viva impressão recebida, com uma abundancia extrema de pormenores sensiveis, n'um quadro que se grava na memoria, passa a atacar outro assumpto e a pintar outro quadro, sem procurar convencer o leitor da efficacia da analyse e da fidelidade da pintura. No seu desdem de artista e no seu orgulho de inventor, parece crer que a evidencia é a atmosphera da intelligencia e repelle a prova como um pleonasmo. Nenhum dos nossos escriptores merece mais ser lido, nem carece mais de ser lido com cautela.

IV
OS SENTIMENTOS

Estudada a sua intelligencia passemos a estudar a sua sensibilidade; esta não é menos interessante do que aquella.

Qual é o numero, a força, a especie das suas emoções? Certamente ellas são numerosas. A emoção é um estado habitual da sua alma. Qualquer que seja o assumpto de que se occupa, a paixão abunda. Isto é visivel sobretudo pelo tom do seu estylo. Historia ou critica, jornal ou theoria, tudo quanto escreve é animado por um sopro quente de commoção sincera. Nenhuma idéia lhe apparece como um simples objecto de comprehensão, mas como uma verdadeira fonte de impulsões.

Frequentes e intensas. Basta percorrermos os seus livros, mesmo de relance, para nos convencermos que a força das suas emoções é tão grande como a sua constancia é perfeita. Vehementes sempre, violentas muitas vezes, ellas constituem pela sua multiplicidade e continuidade um estado habitual de exaltação da sensibilidade. Dotes estes, que ligados á sua capacidade de visão, concreta e ao seu vivo sentimento dos totaes, dão a este historiador um alcance de artista e fazem d'este publicista um verdadeiro poeta.

Ardentes e frequentes. Até aqui não vimos das suas emoções senão a quantidade, e isso mesmo dentro d'aquelles limites de imperfeita approximação que não é dado á Psychologia transpor. Vejamos agora a sua qualidade, isto é a especie dos sentimentos, e ordem dos agrupamentos.

Sem duvida essas emoções são tristes. O bem estar em frente da realidade, a alegria de viver, não são sentimentos proprios do seu espirito. A gravidade e a tristeza que elle considera como qualidades da alma portugueza, são-no tambem da sua mesma alma. Se a dor é um maximum de sensação, a extrema sensibilidade é um principio de soffrimento.

Capaz de emoções frequentes e vehementes, e propenso a emoções graves e tristes, vejamos que sentimentos são despertados n'elle ao contacto dos objectos, como elles se combinam com as ideias, quaes d'entre elles se transformam em paixões, e são capazes pela sua persistencia e efficacia de lhe governarem a actividade.

Certamente não é a belleza physica que se impõe á sua admiração. Escriptor de imaginação psychologica, a harmonia das linhas e o esplendor das côres deixa-o insensivel. Nós só nos commovemos com aquillo que percebemos, e a nossa sensibilidade é solidaria com a nossa intelligencia. Por isso no espirito que analyso, o enthusiasmo franco em frente da magnificencia da materia, a sympathia ardente pelo livre jogo das forças naturaes, não são visiveis. Se o Paganismo significa o amor da vida corporal e o predominio da actividade instinctiva, em contraposição com o Christianismo, considerado como uma reacção espiritualista, e uma repressão systematica das paixões organicas, não se lhe poderia chamar pagão. Mas a solidez da sua razão prática e a energia das suas tendencias moraes prohibe que o consideremos christão. Não é christão porque é mais largamente humano.

Em parte nenhuma isto se verifica melhor do que na sua concepção do amor. A psychologia das paixões mostra que este sentimento é o mais complexo, e portanto o mais instructivo documento que se póde explorar para a intelligencia de um coração. Não temos do Sr. Oliveira Martins uma colleccão de poesias lyricas onde possamos estudar todos os cambiantes, de que um tal sentimento se reveste ao passar pelo seu espirito. Mas n'essas admiraveis paginas finaes da Historia romana, em que o philosopho resumiu as suas idéias sobre a Vida, e o poeta poz a nú a sua alma, a confissão involuntaria vale por um documento especial. Ora de todos os elementos que podem entrar na composição d'esta paixão, elle só vê dois: o instincto animal e a compaixão. A energia dos seus instinctos moraes regeita o primeiro como inferior, e a mulher apparece-lhe não como um arrebatamento dos sentidos, uma satisfação do orgulho, um objecto de posse, um assumpto de analyse, uma visão divina imposta á admiração do artista, mas como um ente digno de piedade e necessitado de protecção. Alguma coisa de viril e triste caracterisa esta concepção. Ella é propria dos homens em que o dom da analyse perspicaz está ligado a vigorosos instinctos moraes.

É que a energia da affirmação moral dá a chave d'este caracter. Esta energia de affirmação é tanto maior quanto no espirito de que nos occupamos ella não é uma força cega, mas coexiste com a vasta intelligencia comprehensiva e a grande curiosidade activa. Sentimentos e idéias tudo está nelle submettido a uma forte disciplina e subordinado a um plano determinado por uma livre resolução. Um vivo sentimento da dignidade humana, um amor apaixonado da justiça, brilha na sua Historia. Em balde a sua penetrante intelligencia lhe mostra o mechanismo dos factos sociaes e a majestade das causas permanentes. A energia da sua sensibilidade persiste a despeito da efficacia da analyse, e n'elle a philosophia não annulla o sentimento moral. Vinte vezes nas suas narrativas os movimentos de admiração ou colera, de indignação ou compaixão, cortam a exposição dos successos. Bem que veja a fatalidade do curso dos acontecimentos, não pode resignar-se á exposição desinteressada e calma. Padece e triumpha com os seus personnagens e sobre tudo admira com vehemencia os seus heroes. É preciso ler no Portugal Contemporaneo a historia de Manoel Passos para ver como a energia de uma qualidade estructural resiste a toda a acção da cultura, e reapparece nos momentos decisivos. Este profundo psychologo, este historiador que explica os conjunctos pelas causas, pára de repente, soltando um applauso ou lançando um sarcasmo. A grande curiosidade indifferente que considera as almas como theoremas, e as sociedades como systemas, e que não vê no mundo senão um mechanismo a explicar, não é a forma propria da sua actividade mental. O Sr. Oliveira Martins está isento d'esta magnifica e perigosa exageração, pela sua robusta saude moral, pelo equilibrio estavel das suas faculdades. Incapaz de ver no Universo um ser divino a adorar, ou um simples mechanismo a comprehender, igualmente afastado da sensibilidade religiosa como da sensibilidade philosophica, escapa ás duvidas e incertezas inherentes á falta de solução do problema da Vida, pela energia da vontade e pelo habito da acção. E em quanto o seu amigo Anthero de Quental, impellido pela intemperança desmedida dos seus desejos, pela grandeza e incoherencia dos seus instinctos metaphysicos, rolava pela ladeira do pessimismo ao abysmo da negação, o Sr. Oliveira Martins não mais feliz do que elle na solução dos problemas da Existencia, appellava para a força intima da sua alma, e resignava-se a acceitar a vida sem protestos vãos nem gigantescas indignações.

Comtudo seria um erro consideral-o um stoico. Para sel-o, falta-lhe aquella perfeita afinação da intelligencia com a vontade, que segundo a sua propria definição constitue o caracter. Herculano, poeta da Energia, pôde sel-o; não o Sr. Oliveira Martins, psychologo por officio e que tem visto a vida e a historia com olhos de philosopho. A capacidade de fazer reviver em si os alheios sentimentos e paixões, e o habito de os comprehender e explicar como factos naturaes, determinados por causas, se não é bastante para abafar n'elle os movimentos do coração, e leval-o a observar o mundo com a indifferença immoral dos artistas, impedem contudo a faculdade da convicta approvação ou reprovação que constitue o fundo do estoicismo. A Justiça é para elle um amor, não um dogma.